CPI Copasa encontra irregularidades

quarta-feira, 4 de abril de 2018

O documento expõe e analisa várias irregularidades, vícios contratuais, ilegalidades da prestação dos serviços e denuncia graves omissões da Companhia

Sgt. Elton conclui trabalho da CPI
Foi apresentado na tarde desta quarta-feira 4, em sessão extraordinária da Câmara Municipal, o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que investigou a prestação de serviços da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), contratada pelo município para prover o abastecimento de água e o esgotamento sanitário de Divinópolis.

Presidente Adair recebe relatório
A reunião foi presidida pelo vereador Adair Otaviano (MDB) e conduzida pelos vereadores Sargento Elton Tavares (PEN), presidente, e Zé Luiz da Farmácia (PEN), relator, presentes os demais membros da CPI: Ademir Silva (PSD), Cleiton Azevedo (PPS) – autor da iniciativa – e Roger Viegas (PROS).

O documento final, entregue ao presidente da Casa contém 106 páginas, organizadas em seis partes. Nas duas primeiras, como introdução, informa os fundamentos básicos e legais da CPI, a começar pelo papel da Câmara nesse processo fiscalizatório, finalidades e limites da Comissão, metodologia e procedimentos.

Relator Ze Luiz resume o feito
A terceira parte é dedicada a registrar os documentos apresentados, requerimentos sem respostas, depoimentos colhidos nas reuniões públicas e principais diligências externas.

Ausência de processo licitatório

A quarta parte apresenta o relatório propriamente dito, ao mesmo tempo em que são analisados os fatos e atos encontrados, e constata de início a primeira irregularidade: não houve licitação para contratação dos serviços da Copasa, como estipula a legislação aplicável à concessão de serviços públicos pela municipalidade.
O contrato não satisfaz à estrita legalidade exigida da Administração, pois o interesse público foi colocado de lado em prol do particular, senão vejamos: ausência do processo licitatório que justificasse essa descabida dispensa que se baseou o contrato em comento, quando prerrogativas que têm o poder público foram invertidas em benefício do particular, no caso, a COPASA (Pág. 29).
Na análise das cláusulas contratuais, são apontados vícios formais na sua elaboração, que comprometem o documento, como o não detalhamento adequado do objeto a ser contratado.

Compromisso não cumprido

A Comissão constata que nenhuma atividade de implantação e operação das Estações de Tratamento de Esgoto (ETE), no bairro Terra Azul, no Nova Fortaleza I e no Costa Azul, ocorreram conforme condiciona o contrato. Nessas localidades existem apenas fossas sépticas, cuja manutenção é feita pela prefeitura e não pela Copasa.
[...] merece uma maior atenção, pois foi com base em supostos tratamentos no esgoto dos bairros Nova Fortaleza I e II, Terra Azul e Costa Azul, ou seja, na operação destas ETEs que o Decreto nº 9.969 de 04/07/2007 regulamentou a cobrança da tarifa pelos serviços de esgotamento sanitário no Município (Pág. 36)
A cobrança de tarifas de esgoto, portanto, sem o efetivo funcionamento das referidas ETEs, como prevê o contrato questionado, é considerada irregular e indevida.

O relatório enfatiza que os prazos de execução de cada etapa, definidos em Anexo do contrato, vêm sendo prorrogados conforme a “necessidade ou conveniência da Copasa”, sob a conivência do Executivo Municipal.
[...] o que falta à COPASA para cumprir o objeto do contrato integralmente é mais seriedade com os seus compromissos, o que não pode ser observado nos depoimentos e relatórios da ARSAE (2016) para abastecimento e saneamento (Pág. 37)
Continuidade comprometida

Considerando depoimentos colhidos dos órgãos responsáveis pela concessão da licença ambiental necessária para o empreendimento, constatou-se a indiferença da Companhia, que atuou irregularmente em face das exigências até 2011, quando deu entrada com o pedido de licenciamento, só concluído em 2016.

Em análise da Cláusula Terceira do contrato, a Comissão verificou que “condições efetivas de regularidade, continuidade e eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia e modicidade tarifária”, estão comprometidas nos seus parágrafos, ao elencar “uma série de situações que podem descaracterizar a regularidade e qualidade na prestação dos serviços”, o que dificulta a aplicação desses preceitos (Pág. 39).

Qualidade da água insatisfatória

Diante dos problemas de abastecimento ocorridos no período da CPI, relacionados à oferta e qualidade do produto, atingindo dezenas de bairros, ficou evidente que a empresa não tem tomado as providências quanto aos equipamentos e máquinas utilizados no tratamento da água. O relatório enfatiza ainda, que a prestação deste serviço era discriminatório, pois centenas de moradores não tiveram o mesmo atendimento.
A continuidade é imprescindível, a interrupção do serviço, ainda que por pouco tempo, provoca consequências irreparáveis aos usuários. A eficiência é importantíssima, pouco adianta a continuidade, se os meios de prestação do serviço forem deficientes e inadequados para atender à demanda (Pág. 40).
Situação econômica desconhecida

O exame dos dispositivos contratuais prossegue na Cláusula Quarta, sobre o regime de remuneração dos serviços, “questão que deve ser melhor investigada, oportunamente pelo Ministério Público”, sugerindo ter ocorrido renúncia de recursos públicos em favor da Companhia.
No caso, não houve por parte do município, qualquer publicação de justificativa, nem mesmo o processo licitatório de dispensa foi apresentado, como maneira de justificar os motivos que levaram o gestor a tomar a decisão de conceder a prestação dos serviços a COPASA (Pág. 42).
Assinala o documento da CPI, que, desde 1973, a empresa vem explorando com lucratividade significativa os serviços de abastecimento e, mais recentemente, a rede de esgoto urbana construída pelas administrações municipais do passado, especialmente desde os anos 1960-70.

Durante todos esses anos, a Copasa realizou investimento mínimo operacional, mas desproporcional à sua arrecadação e à demanda da cidade, o que vem afetando a continuidade dos serviços locais. Além disso, é beneficiada com isenção de tributos e taxas municipais sem a devida revisão nos valores das tarifas, como recomenda a legislação.

Informações imprecisas sobre repasses

Os membros da CPI notaram que o Portal da Transparência da Copasa não dá publicidade sobre o cumprimento das atividades contratuais, como o repasse de 4% da arrecadação mensal da tarifa bruta de água ao erário municipal.

Também não há “justificativa econômico-financeira acerca da fixação deste percentual”, e nem publicidade dos dados sobre o quanto é repassado ao município, a viabilidade econômica da empresa, do faturamento ou da viabilidade tarifária, como exigido por lei (Pág. 44).

Com base em documentos anexados ao relatório, a Comissão cobra posição sobre o repasse de 2013, que se encontra em aberto no controle da contabilidade municipal, e obtém resposta imprecisa:
A princípio, a Copasa havia informado que havia repassado ao Município. Novamente questionada, a empresa informou que, na verdade, os valores correspondentes a esse período foram retidos, tendo em vista um termo de compromisso assinado entre o Município de Divinópolis e a COPASA, e nesse momento, junta o termo (Pág. 44).
Para esclarecer a situação de “descontrole contábil do contrato”, a Comissão requereu à Fazenda Municipal documentos e informações, mas ressalta que não foi atendida. Anota que a municipalidade desconhecia o referido termo de compromisso, o que ficou evidente quando a Secretaria Municipal de Fazenda Pública recorreu à empresa para obter conhecimento sobre o ato (Pág. 44).

A investigação dos fatos relacionados ao contrato, retirados dos depoimentos prestados pelos agentes do Executivo e funcionários da Copasa, sugerem não existir um “arquivo formalizado referente aos termos de concessão dos serviços de saneamento básico concedidos à Copasa, como determina a legislação e a correta prática administrativa” (Pág. 46).

Usuários desconhecem papel da Arsae

Ainda sobre os Portais da Transparência da Copasa, do Município e da Agência Reguladora (ARSAE), o documento da CPI destaca que “impuseram-se obrigações aos usuários, mas esqueceram-se de informá-los”, após verificar que nesses endereços não existem referências às obrigações dos usuários, como determina a Cláusula Oitava.

A Comissão avalia que a Agência Reguladora (ARSAE) não vem cumprindo integralmente suas finalidades: a regulação é deficitária e a fiscalização inócua, pois não tem poder para impor penalidades. Nos últimos seis anos, apresentou apenas dois relatórios técnicos sobre a situação de água e esgoto em Divinópolis, e assim mesmo, “sem nenhuma consequência prática”, a não ser a tarifação injusta para a população (Pág. 48).
A imparcialidade da ARSAE fica em xeque, quando da sua inércia diante de vários problemas ocorridos em Divinópolis em decorrência da má prestação de serviços da COPASA no município. É de se espantar a sua conduta: não se tem conhecimento de nenhuma ação efetiva por parte desta agência (Pág. 48).
Transferência duvidosa de ativos

O relatório final da CPI, em curso de exame acurado do contrato, refere-se à cláusula dos bens reversíveis, ressaltando existir pontos duvidosos, a começar pela avaliação dos ativos destinados pelo município à Companhia.

Outro ponto é do município “ter se responsabilizado pelos pagamentos das tarifas, pelos serviços de esgotamento sanitário no município, em substituição aos usuários/ consumidores, usando parte do dinheiro da indenização dos ativos ao município, em ano, coincidentemente, eleitoral” (Pág.52).

Um aspecto grave identificado pela Comissão refere-se à questão ambiental, de preservação dos mananciais localizados na área de captação dos rios Itapecerica e Pará, como determina o Programa Estadual de Conservação da Água. A empresa está obrigada a investir na proteção e na preservação desses recursos hidricos o equivalente a 0,5% (no mínimo) do valor total da receita operacional apurada no exercício anterior.

A par dessas obrigações, a Companhia tornou-se a maior fonte poluidora de Divinópolis, por procrastinar a construção do sistema de tratamento da ETE Itapecerica para aliviar o rio do esgoto urbano que lhe é lançado. As obras da estação são lentas e a rede coletora, assism como as elevatórias, nem sairam do papel.

Companhia não acompanhou crescimento da cidade

Após a análise dos termos contratuais, a Comissão expõe que nos últimos 40 anos, em que a empresa presta seus serviços a Divinópolis, a população passou de 80.344 (em 1973) para 234.937 habitantes, segundo dados do IBGE (2017).

Nesse período, além do aumento da população, a cidade se modernizou com a instalação de inúmeras indústrias, prédios residenciais e comerciais, escolas etc. Todavia, mesmo com o significativo crescimento demográfico e econômico, a Copasa, mesmo recebendo pelos serviços, “absteve-se de realizar os investimentos necessários para atender à crescente demanda por água tratada e saneamento básico adequado”.
A Concessionária não executa o contrato a contento, pois está deixando o sistema hídrico exaurir-se e deteriorar-se. Com a anuência do Município, vem postergando a construção da ETE, obras que, verdadeiramente, tratará o esgoto que hoje é jogado no rio Itapecerica, uma das principais fontes hídricas da cidade (Pág. 56).
Segundo o relatório, “há elementos suficientes para demonstrar, de forma uníssona, o desabastecimento e a água imunda que foi servida para a população”, restando, pois, demonstrada a falha na prestação desse serviço essencial do Município.

Usuários sofrem com água contaminada

Também a falta de informação sobre a qualidade da água oferecida em determinados bairros foi verificada pela CPI. Nem o Executivo ou consumidores foram avisados dos problemas sucessivos na estação de tratamento de água, que prejudicaram o fornecimento e a qualidade do produto.

Com essa omissão, a água imprópria para consumo, entre julho e novembro de 2017, acabou gerando muitas reclamações e atendimentos médicos de consumidores com dores abdominais, vômitos e diarreia, entre outros problemas, causando intenso movimento nos hospitais privados e na UPA Padre Roberto.

CPI recomenda imediatas correções e punição

O relatório final da CPI, em sua conclusão, observa que a relação jurídica e o histórico da Copasa em Divinópolis foram investigados e estudados com a atenção. A partir do inquérito se observa que “os agentes políticos, no presente contrato, praticaram atos ditos contrários aos princípios que regem a administração pública, que pelo conteúdo lesivo causado ao erário merecem censura e sanções administrativas, cíveis e penais” (Pág. 102).

No decorrer dos trabalhos da Comissão, várias irregularidades foram confirmadas, assomando como as mais graves, entre outras:

- ausência de processo licitatório para a concessão dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no município;

- desconformidade dos termos contratuais com a Lei Federal n. 8.987/95;

- ausência de avaliação por parte da Procuradoria Municipal, quanto à legalidade e conformidade dos procedimentos e do contrato com a legislação vigente;

- ausência de investimentos e comprometimento na preservação ambiental.

Sob “fortes indícios de irregularidades”, portanto, a situação da Copasa em Divinópolis requer do Executivo Municipal uma avaliação dos problemas e as devidas correções imediatas na concessão dos serviços prestados pela Companhia. Requer também do Ministério Público “as responsabilizações cabíveis, uma vez que o gestor municipal não é o dono do interesse público, mas, sim, um preposto, que só pode fazer o que a lei autoriza ou determina” (Pág. 103).

O vereador-presidente da Câmara, Adair Otaviano (MDB), encaminhará o documento final da CPI, para conhecimento e as esperadas decisões, ao Prefeito Municipal Galileu Machado, à Superintendência da Copasa, ao Ministério Público, à Arsae e ao Tribunal de Contas do Estado. Caso nenhuma providência seja tomada, a presidência deve propor Decreto Legislativo, adotando as medidas que a Casa determinar.


Texto: Flávio Flora
Fotos: Helena Cristino

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